Jus esperneandi*

Rei morto, rei posto.

No poderoso país localizado acima do Rio Grande, lá está um presidente derrotado nas últimas eleições fazendo birra. Mesmo sabendo que no dia 20 de janeiro próximo terá de cair fora da Casa Branca, o histriônico Trump continua soltando traques e demitindo quem se opõe à sua permanência. Como outro presidente que conhecemos bem, também portador de graves transtornos de personalidade e de caráter, Trump poderá ser indiciado e preso logo após perder seu mandato. São inúmeras as acusações, que vão desde abuso de poder até calote na Receita. A imprensa dos EUA descobriu que ele não pagou o imposto de renda em 10 dos últimos 15 anos. Embora tenha uma fortuna calculada em mais de US$ 4 bilhões, ele só pagou 750 dólares no ano em que concorreu para presidente. Vale lembrar que Al Capone, também nascido em Nova Iorque, só foi preso quando deixou de pagar o imposto de renda.

Com a derrota de Trump nos EUA, o meme mais divulgado nas redes sociais do Brasil não poderia ser outro: Donald já foi, agora só falta tirar o Pateta.

O amor de Bolsonaro pelo Trump é explícito. Ao encontrar seu ídolo nas Nações Unidas, o capitão não segurou e soltou um I love you. E nem ficou magoado quando o presidente dos EUA respondeu: “Bom te ver de novo”. No ano passado, Bolsonaro decidiu indicar seu filho (um dos zeros à esquerda) para embaixador do Brasil nos EUA. A justificativa (além do filho saber fritar hambúrguer) seria a afinidade do filhote com a família Trump. A pretensão era tão absurda que Bolsonaro acabou não indicando ninguém. O novo embaixador só foi aprovado pelo Senado há dois meses.

Ao contrário do Bolsonaro, que não entende a pressa das pessoas por uma vacina, Trump contava iniciar a distribuição da vacina antes das eleições. Uma espécie de fake news para conquistar votos. Mas os dois encorajaram as manifestações contra o distanciamento social e, tanto Trump como Bolsonaro, criticaram os governadores que aderiram às recomendações da Organização Mundial de Saúde. Em julho, o governo dos EUA rompeu suas relações com a OMS. Pau mandado, Bolsonaro declarou na época: “E adianto aqui, os Estados Unidos saíram da OMS, e a gente estuda, no futuro, ou a OMS trabalha sem viés ideológico, ou vamos estar fora também. Não precisamos de ninguém de lá de fora para dar palpite na saúde aqui dentro”.

Há pouco menos de um mês, ao falar para os alunos do Colégio Rio Branco (Itamarati), o ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, declarou: “Se falar em liberdade nos faz um pária internacional, que sejamos um pária”. Infelizmente, mercê das políticas ditadas por pessoas como Bolsonaro e seus ministros, o Brasil já está sendo considerado um pária no concerto das nações. Em menos de dois anos, perdemos o que conquistamos desde a transição para a democracia. Mesmo com todo o nosso potencial e riqueza, somos hoje considerados uma nação de terceira na diplomacia internacional. Bolsonaro e Ernesto Araújo já atacaram a Argentina (maior comprador de produtos manufaturados brasileiros), China (maior importador do Brasil), os EUA de Joe Biden (segundo maior importador do país) e diversos países da União Europeia, como Alemanha e França (que estão entre os dez mais importantes parceiros comerciais).

Na última terça-feira, durante a abertura da Cúpula de Líderes do Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), Bolsonaro fez um ataque direto aos países europeus. Sem citar nome, ele declarou que irá divulgar uma lista de países que importam madeira ilegal do Brasil e que são os países que mais criticam a política do Brasil na Amazônia.

Duas questões que, por ignorância, escapam ao presidente: o Brasil é que deveria ter um órgão para controlar o desmatamento e a venda de madeira ilegal e, segundo, não são os países que importam. Empresas importam madeira, seja legal ou não.

Finalmente, mais um registro da citada reunião do Brics. No encerramento da cúpula, o presidente da Rússia teceu loas ao colega do Brasil. Vladimir Putin considerou Bolsonaro “um exemplo” por sua gestão na pandemia do coronavírus e exaltou suas “qualidades masculinas”. Para nós, brasileiros, Bolsonaro foi um aliado da Covid-19, com uma atuação criminosa, negacionista, caótica e irresponsável. Com relação às suas qualidades “masculinas”, teríamos de perguntar ao dirigente russo quais foram.

* a expressão, embora pareça, não existe em latim e significa o direito de espernear e reclamar.

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Publicado por blogdocondearthur

Publicitário, jornalista e escritor

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